KUNDUN
Opinião
Kundun significa “A Presença”. Era disso que os tibetanos precisavam quando foram invadidos violentamente pela China em 1950, quando o governo comunista de Mao queria banir a religião (considerada um veneno), expulsar os monges, proibir o culto e “libertar” os tibetanos do imperialismo. Incrustrado no Himalaia, o Tibete pediu ajuda internacional para não sucumbir ao poderio chinês, clamou pelo reconhecimento como região autônoma, mas não obteve ajuda. A presença de espírito do 14º Dalai Lama (então com 15 anos) diante do conflito, faz com que adote uma postura de não-violência, mesmo quando vê milhares de camponeses serem mortos pelas tropas do Partido Comunista, quando presencia a invasão de Lhasa e o sofrimento do povo. Mas corre risco de vida e não resiste – acaba fugindo com outros líderes religiosos para a Índia em 1959 respaldado pelo primeiro-ministro indiano na época, Jawaharlal Nehru, e instala ali o governo tibetano no exílio.
Além de extremamente bem cuidado e minucioso, o filme de Martin Scorcese (também em Ilha do Medo) retoma um importante conflito regional, esquecido nas remotas montanhas do Himalaia, mas que tem suas consequências até hoje. Retoma as tradições tibetanas da procura pelo Lama (mestres budistas tibetanos), que eles acreditam ser a reencarnação do Buda da Compaixão, da sua educação dentro dos palácios do Tibete e a interrupção dessa tradição pela ganância chinesa. Vivendo até hoje em Dharamsala, saiu pela primeira vez da Índia em 1967 para lutar pelos direitos humanos, recebeu o prêmio Nobel da Paz em 1989 por sua postura pacífica e desde então percorre o mundo pregando a não-violência e da tolerância.
Os conflitos no Tibete continuam até hoje. Monges tiram a própria vida queimando o corpo em praça pública para protestar e chamar a atenção da comunidade internacional, enfrentam os soldados chineses, pedindo a volta do Dalai Lama ao Tibete e a liberdade religiosa e cultural. Kundun é um importante e lindo registro de um momento histórico que ainda ganha as manchetes dos jornais com notícias de massacres e tensão entre as partes. É um daqueles filmes, assim como Gandhi, que valem ser vistos, não só pela qualidade cinematográfica irretocável, mas também para entender o nosso mundo.
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