FAMILIAR TOUCH

Cartaz do filme FAMILIAR TOUCH

Opinião

Sarah Friedland é uma cineasta jovem que faz um filme sobre envelhecimento. Ou melhor, sobre a passagem do tempo, o chamado gênero coming of age — porque, afinal de contas, o tempo passa todos os dias. Estamos envelhecendo, independente da idade de cada um de nós. A questão é que a vivência da etapa da vida em que a vulnerabilidade é mais evidente e muda a percepção de mundo e de nós mesmos, é negligenciada. O etarismo é fato, mas o positivo é que há mais espaço pra falar disso, cuidar e observar como o corpo se comunica, apesar de a pessoa não estar mais presente como antes.

Depois de anos convivendo com a avó com demência, Sarah trabalha como cuidadora de idosos. Observar como o corpo se comunica nessa fase foi chave na construção de FAMILIAR TOUCH — que tem o toque no título, também sugerindo que a experiência que o filme propõe pode ser algo familiar pra qualquer espectador. Ruth Goldman (Kathleen Chalfant, que levou o prêmio de atriz em Veneza) mora numa residência assistida, tem importantes lapsos de memória e ora se percebe com 80 anos, ora com 25. Mas seu corpo se expressa, suas habilidades de cozinheira a conectam com o presente e embora não reconheça o filho na maioria das vezes, está presente de outras maneiras nesta nova realidade. O que Sarah faz é propor uma mudança de olhar de quem acompanha o idoso: desapegar daquela pessoa que agora se relaciona diferentemente com o mundo e com os outros, sem que isso gere mais sofrimento. Sim, porque a passagem do tempo é inevitável e precisamos aprender a lidar com isso.

Através do cuidado e dos gestos, FAMILIAR TOUCH constrói uma perspectiva diferente que enobrece a relação que já não pode ser a mesma e existe de outra maneira. Sarah ganhou o prêmio de melhor direção na categoria Orizzonti no Festival de Veneza e também o Leão do Futuro — Luigi De Laurentiis, por este seu primeiro longa. Sarah contou em Veneza que a dança e a coreografia fazem parte da sua formação pessoal e profissional. Não é para menos: seu filme é sobre comunicar-se através de outra linguagem. Um convite para nos prepararmos para sermos melhores interlocutores. Um convite desafiador, sensível e delicado, diante da inexorável passagem do tempo.

 

 

Comentários