INGEBORG BACHMANN – JOURNEY INTO THE DESERT
Opinião
Suzana Vidigal _ especial 73ª Berlinale
INGEBORG BACHMANN – JOURNEY INTO THE DESERT foi o primeiro título que Margarethe von Trotta imaginou para o filme. “Primeiro é o deserto emocional na relação de Ingeborg Bachmann com Max Frisch”, diz ela na entrevista coletiva ao apresentar o filme na Berlinale. “Depois, é o deserto que a liberta.” Ingeborg chega no deserto arrasada pela ruptura com o marido e depois percebe que aquele lugar é a sua salvação daquela relação tóxica e do sentimento de rejeição.
A austríaca Ingeborg Bachmann (1926-1973) é uma das mais renomadas poetisas do século 20, marcando especialmente o período pós-guerra. Mulher à frente do seu tempo. Vicky Krieps a representa na sua mais intensa fatia, tanto na euforia, quanto na melancolia (também em Trama Frantasma e Corsage). “Sempre me questionei muito sobre nosso papel no mundo, sobre o circo que as pessoas criam e sobre como usar as palavras”, diz a atriz. “O deserto é o lugar do silêncio que eu sempre busquei na vida e também é o lugar central para a personagem.”
A postura de Ingeborg é construída através dos anos em que viveu com o arquiteto e escritor suíço Max Firsch (final dos anos 1960), e não pretende fazer uma cinebiografia da poeta. De novo aqui, a opção por um recorte específico, a parte pra desenhar o todo. Segundo disse Vicky Krieps, “o que fascina é poder falar das questões femininas em várias gerações; você cria um filme e enquanto isso várias coisas estão acontecendo no mundo”. Captar isso contextualiza no figurino, no contexto histórico como pano de fundo. “Se você faz um filme sobre um tempo em que era difícil ser mulher e em que o homem era o líder e você dialoga com o passado, porque mostra as limitações masculinas nos relacionamentos daquele tempo”, explica von Trotta. “Naturalmente estamos mostrando as mudanças que aconteceram no passar do tempo, mas é curioso porque ao mesmo tempo que ela é uma mulher emancipada, ela sofre por amor.”
Poético, INGEBORG BACHMANN – JOURNEY INTO THE DESERT é uma viagem pela alma da poeta, com o foco na mulher, no relacionamento e na sua visão libertária. Pra quem não consumiu as poesias de Bachmann como eu, falta contexto. Mas von Trotta é alemã, tem na veia o arquivo poético de Bachmann e este repertório faz parte da história alemã e suas referências.
Mesmo assim, dialoga com mulheres universalmente e gosto dessa visão fechada capaz de ampliar à medida que a narrativa evolui. E evolui picotada, em flashbacks constantes, construindo um mosaico interessante. Vicky Krieps, com seu lindo figurino, representa a poeta na alegria e na tristeza, em alemão, francês e italiano, fazendo os jornalistas rirem quando disse que uma das poucas vantagens de nascer em Luxemburgo é crescer poliglota. Não é pouca coisa!
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