ZONA DE INTERESSE – The zone of interest
Opinião
ZONA DE INTERESSE é um filme sensorial e você já vai perceber isso na cena de abertura. Mas, diferente de usar o olhar como sentido mais imediato como fazemos sempre ao assistir a um filme, a proposta aqui é diferente e nos tira da zona de conforto. Portanto, aguce sua audição. É através dela que está a provocação e o impacto da história. Não é à toa que concorre ao Oscar de melhor som, além de ser indicado em outras 4 categorias: filme, diretor, filme estrangeiro e roteiro adaptado.
Na cena de abertura, atenção ao que ouvimos, mas teimamos em não escutar. Escute com atenção e você sentirá a transição acontecendo entre o horror e a beleza. É sutil, mas é também evidente. E essa é a proposta: questionar a nossa zona de interesse, o que nos convém, o que nos faz dançar conforme a música pra colher privilégios, mesmo que o horror more ao lado.
Literalmente. Adaptado do romance de Martin Amis, o diretor britânico Jonathan Glazer conta a história do comandante de Auschwitz, Rudolf Höss (Christian Friedel), que mora com sua família numa casa vizinha de muro do campo de concentração. Sua esposa Hedwig (Sandra Hüller) faz cara de paisagem, desfruta de uma vida cheia de privilégios e se considera a “rainha de Auschwitz”. Tudo parecendo muito real mesmo — pra isso, as câmeras foram escondidas (às vezes 10 filmando ao mesmo tempo) e não havia iluminação artificial. Tudo para que os atores agissem com mais naturalidade possível.
ZONA DE INTERESSE causa um impacto enorme que repercute dentro do peito horas ainda depois do fim. Aliás, o fim é forte e reforça, inclusive, que essa história não termina aí. Normatizando a violência de que o ser humano é capaz, contrastando a fumaça do outro lado do muro com o jardim com piscina e flores, Glazer traz o filme pra atualidade de uma forma muito fria e cruel. Muros de novo, tapando o que não queremos enxergar; a vida familiar, o beijo dos jovens apaixonados, os desafios do trabalho — tudo acontece na mais perfeita normalidade enquanto centenas de milhares de judeus são mortos do lado de lá do muro. Como bem disse Glazer em Cannes, “o filme é uma visão do século 21 justamente pra trazer essa realidade pra hoje e não criar uma distância conveniente na linha do tempo”. Por isso o filme não tem uma pegada vintage: o figurino, a casa, o muro, é tudo com cara de novo. Não tem cara de filme histórico, em um lugar longínquo no tempo e no espaço. Está acontecendo hoje, aqui e agora.
Comentários