O ACONTECIMENTO – L’Événement

Cartaz do filme O ACONTECIMENTO – L’Événement

Opinião

A gravidez indesejada de Anne é pra ela “uma doença que só acomete mulheres e que as torna donas de casa”. Nos anos 1960, na França, o aborto dava cadeia e Anne se vê sozinha no enfrentamento dessa realidade.

O ACONTECIMENTO, adaptado do romance autobiográfico e homônimo de Annie Ernaux, ganhou o Leão de Ouro de melhor filme em Veneza em 2021 e retoma o tema que também passou recentemente por outros festivais, com filmes impactantes, fortes. Lembro de Nunca, Raramente, Às Vezes, Sempre, de Eliza Hittman, que levou o Urso de Ouro em Berlim em 2020 – e lembro bem do impacto que me causou. Este ano, a Berlinale apresentou Call Jane, de Phyllis Nagy, também sobre a ilegalidade e a rede de mulheres nesse suporte.

São filmes feitos por mulheres, nesse tema importante da quebra de um padrão único que serviu à ordem da sociedade durante tanto tempo. Anne engravida aos 20 e poucos, não quer abrir mão de sua carreira, nem de sua vida pessoal. Faz parte da classe operária francesa daqueles anos 1960, mas não se vê no papel reservado à mulher nessa sociedade. Quer pertencer a outro lugar. Opta pelo aborto, mas enfrenta a ilegalidade e a violência do procedimento. É o sofrimento do corpo que nos conta quem é Anne emocionalmente. Através da narrativa da sua dor física, conhecemos a Anne firme, ereta, decidida.

A mudança do corpo vai dando o peso da tensão, sinalizando o quanto a experiência também muda a alma. Annie Ernaux assistiu ao filme e diz que a obra “não discute, julga ou mesmo dramatiza”. É verdade. É um recorte de meses definitivos na vida de quem queria ser dona do seu corpo e do seu destino.

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